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domingo, 31 de agosto de 2014

UFG - 2010 - 2º Semestre - 1º Fase - Prova de Língua Portuguesa

Prova de língua portuguesa - UFG - 2010 - 2º semestre - 1º fase

LÍNGUA PORTUGUESA

Os textos I e II servem de referência para responder às questões de 01 a 04.

Texto I
Disponível em: <http//images.google.com.br/>. Acesso em: 5 abr. 2010.

Texto II

Vencedor de Cannes, “Entre os muros da escola”, retrata cotidiano de estudantes franceses

            Em uma escola francesa, na periferia de Paris, reúnem-se jovens de origens, etnias, religiões e hábitos muito diferentes.
            Como Wei, imigrante chinês estudioso e fã de games; Souleymane, filho de imigrantes malineses desinteressado nas aulas, mas com um talento secreto para a fotografia; e Esmeralda, a garota rebelde que só usa gírias durante a classe, mas lê Platão nas horas vagas. Com o giz na mão e a árdua tarefa de atrair a atenção e ensinar francês aos garotos está o professor François Marin, dedicado e apaixonado pelo ofício, mas visivelmente frustrado com a dificuldade de lidar com a falta de interesse da turma. É em torno da relação conflituosa criada na sala de aula que gira o filme de Laurent Cantet.
            Os alunos de Marin são uma espécie de síntese da França atual. Filhos de imigrantes asiáticos, árabes e africanos, não se reconhecem nem como franceses nem como estrangeiros e transitam numa espécie de limbo de identidade. Do outro lado, os professores também não sabem como reagir à apatia e à falta de disciplina dos alunos. E enquanto o assunto é discutido exaustivamente em reuniões a portas fechadas, a escalada da violência na sala de aula aumenta.
            Vencedor da Palma de Ouro em Cannes no ano passado, o filme é baseado no livro homônimo de François Bégaudeau – que também vive o protagonista do filme e assina o roteiro – sobre sua experiência como professor em Paris.
            Apesar de ser uma ficção, a fita tem um tom documental. Com fotografia discreta e sem trilha sonora, toda a ação se passa dentro da escola.
            Os personagens são interpretados por alunos e professores da escola onde foi feita a filmagem.
            Para ter mais agilidade, Cantet optou pelo uso de câmeras digitais, que registraram minuciosamente gestos e expressões dos garotos.
            Partindo de um roteiro inicial genérico, as cenas e os diálogos foram ganhando forma ao longo desse processo, com a participação dos adolescentes e dos professores.

FOLHA DE S. PAULO, São Paulo, 9 mar. 2009, p. 3. Folhateen. Cinema. (Adaptado).

QUESTÃO 01 - Os elementos imagéticos do texto I, tais como a apresentação do título, as diferenças físicas entre as personagens e as posições que elas ocupam no cartaz, aliados às informações do texto II, sugerem que a escola retratada no filme

(A) defende a quebra de regras em nome da liberdade que todo jovem merece ter.
(B) constitui um lugar inacessível para aqueles que migram para outros países.
(C) representa um espaço em que os conflitos emergem, refletindo a realidade da sociedade contemporânea.
(D) desconsidera os conflitos reais e cria a ilusão de ser um mundo ideal.
(E) reforça o seu papel de protetora dos desprivilegiados cultural e socialmente.

QUESTÃO 02 - Segundo a resenha (texto II), a principal ideia defendida pelo filme Entre os muros da escola parte do argumento de que

(A) a comunidade francesa aceita as diferenças culturais advindas da constante imigração afroasiática.
(B) o professor promove a igualdade social em sala de aula ao romper com o abuso de poder.
(C) o debate ideológico entre professor e alunos favorece o amadurecimento social dos adolescentes.
(D) a diversidade multiétnica intensifica a integração sociopolítica dos indivíduos de um país.
(E) a existência de conflitos interculturais abala os alicerces da identidade francesa.

QUESTÃO 03 - Por se tratar de uma resenha jornalística, o autor do texto II avalia o filme recorrendo ao uso de

(A) ironia a respeito da crise política vivenciada pelo sistema educacional francês.
(B) dados que evidenciam o abismo sociocultural existente na sociedade francesa atual.
(C) informações acerca do conflito de gêneros e do papel do professor.
(D) notícias sobre a estreia do filme no festival de Cannes no ano de 2009.
(E) espaços diferentes que marcam a ambientação das cenas do filme.

QUESTÃO 04 - Ao descrever os fatos recriados no filme, o resenhista sugere que, na trama, predomina a

(A) comicidade   (B) incredulidade   (C) denúncia   (D) diversão   (E) ambiguidade

Leia o texto abaixo para responder às questões de 05 a 08.

            A senhora imagine, por favor. Eu tinha dezenove anos. Podia ter mais ou menos, podia ter quinze ou quarenta, essa questão do tempo já não se resolve mais do modo normal para mim, nem me preocupo em saber quantos anos tenho hoje, pode arriscar um palpite, se quiser, pouco me importa, sei que tinha dezenove anos porque a data ficou marcada em vermelho naquele calendário ali, na parede, veja. Aliás, devia rasgar isso, vou rasgar, pronto, rasguei, pode conferir, rasguei o calendário, apaguei o tempo assim, num passe de mágica, agora não saberemos nada do passado remoto, anterior à data marcada naquele ex-calendário, em breve não nos lembraremos mais sequer de que dia é hoje, em que ano estamos, vou fazê-la esquecer de tudo, em breve seremos quase eternos.
            Era uma noite fria, eu estava no metrô, voltando do cinema, não devia ser muito tarde, dez e meia, onze horas, estava com sono, como sempre me acontecia ao sair do cinema, agora não vou mais ao cinema, há milênios não vejo um filme. [...]
            Havia pouca gente no metrô, eu estava sentado sozinho numa fileira de bancos duplos, encostado à janela, não queria pensar em nada, ver nada, só queria ficar quieto, feito um cão sob a marquise num dia de chuva, enroscado em si mesmo, se aquecendo, eu não pensava em nada, via o escuro do túnel pela janela do metrô e os anúncios nas estações quando o trem parava, anúncios gigantes, luminosos. Um deles era de uma churrascaria e fiquei puto, desculpe o linguajar, sei que não gosta desses termos chulos, mas fiquei muito puto quando vi aquele anúncio, um espeto enorme, com a carne sangrando. Senti uma dor na boca do estômago, estava com fome, naquele dia só tinha almoçado, e mal, não tinha um centavo no bolso, só conseguiria algum dinheiro no dia seguinte e o dia seguinte ainda demoraria horas para chegar, aquela foto me acertou um direto na barriga, o cara que botou aquilo ali acabara de me dar um soco, o filho da puta, perdão.
            […] Eu às vezes abordava uns turistas e os mais ingênuos acabavam me aceitando como guia, o que me rendia alguns trocados, vez ou outra ajudava num bar perto de onde eu morava, servia os fregueses, ajudava no balcão quando um funcionário faltava, também trabalhei distribuindo na rua aqueles panfletos de propaganda, na Saara, fazia coisas desse tipo, bicos, nada muito sério, na verdade minha principal fonte de renda, digamos assim, vinha dos livros que eu vendia para os sebos e, vez ou outra, para algum colecionador.
            Os livros eu roubava das bibliotecas. Era um ladrão de livros, ladrãozinho de terceira categoria mas ladrão, roubava de bibliotecas públicas, ou de universidades, vez ou outra arriscava uma livraria também, era um trabalho agradável, se me permitir que chame de trabalho aquele exercício de mudar o endereço dos livros. Meu ganho era mínimo, uma ninharia, mas meus gastos também eram mínimos, de modo que aquilo era o suficiente pelo menos para me manter vivo, e naquela época eu não queria muito mais do que isso, estar vivo.

CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p. 11-14.(Adaptado).

QUESTÃO 05 - Com base no trecho do romance A Confissão, pode-se reconhecer como características discursivas do texto

(A) a descrição do tempo e do espaço, a narração fragmentada de fatos comuns no cotidiano das pessoas e a apresentação de apenas um eixo de conflito, tal como requer o gênero.
(B) a representação cronológica de fatos e experiências, a desvalorização das sensações das personagens e a agilidade narrativa ao apresentar as ações do narrador.
(C) a preocupação com o uso da variedade regional, a definição de traços socioculturais identificadores das personagens e a narração das lembranças em segundo plano.
(D) a narração de acontecimentos particulares, a descrição de sensações e experiências e as escolhas lexicais que marcam a preocupação do narrador em relação ao seu interlocutor.
(E) a utilização do fluxo de consciência, o uso do monólogo interior para expressar os vários estados de espírito vivenciados por outras personagens e o apagamento das marcas de interlocução.
QUESTÃO 06 - O título “A confissão”, associado ao trecho transcrito do romance de Flávio Carneiro, permite a afirmação de que

(A) o narrador-personagem busca em sua memória fatos condenáveis de sua infância para compor um relato escrito.
(B) a trama se constitui na medida em que o narrador-personagem revela seus segredos a um interlocutor específico.
(C) a imaginação perturbada do narrador o leva à ilusão de ser protagonista das experiências relatadas em seu diálogo com a interlocutora.
(D) a revelação dos segredos pelo narrador-personagem desencadeia o início do amor impossível de que trata o romance.
(E) o tempo da narrativa dilui a gravidade dos segredos juvenis do personagem-narrador, tornando-os irrelevantes na fase adulta.

QUESTÃO 07 - No texto, acontece uma transformação no estado de espírito do narrador-personagem. Considerando a ordem das expressões abaixo, quais figurativizam essa transformação?

(A) “Cão sob a marquise” e “fiquei puto”.
(B) “Filho da puta” e “boca do estômago”.
(C) “Ladrãozinho de terceira categoria” e “bicos”.
(D) “Apaguei o tempo” e “passe de mágica”.
(E) “Endereço dos livros” e “uma ninharia”.

QUESTÃO 08 - No trecho, “desculpe o linguajar, sei que não gosta desses termos chulos”, o modo imperativo do verbo indica

(A) súplica para conquistar a adesão do interlocutor às ideias do narrador-personagem.
(B) ordem expressa para conduzir as ações praticadas pelo interlocutor.
(C) pedido formal para marcar o lugar de autoridade do locutor.
(D) estratégia de atenuação para garantir a manutenção da interlocução.
(E) mecanismo de simulação para distorcer as reais intenções do narrador-personagem.

Leia o texto abaixo para responder as questões 09 e 10.

Disponível em: <http://www.1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2211200904.htm>. Acesso em: 1º dez. 2009.

QUESTÃO 09 - Com base nos quadrinhos, que fenômeno de linguagem pode ser relacionado à compreensão de que os registros dos ciclos biogeoquímicos são imperfeitos?

(A) O uso de gírias atuais, como “bróder” e “demorô”, na fala do esqueleto.
(B) A utilização do tempo pretérito para se referir aos fósseis.
(C) O predomínio da linguagem formal na fala do cientista.
(D) A oposição conceitual entre os termos “pia” e “privada”.
(E) A negação enfática e intrometida do esqueleto no segundo quadrinho.

QUESTÃO 10 - No texto, a expressão “elo perdido” apresenta dois sentidos diferentes. Quais são esses dois sentidos?

(A) Cadeia inorgânica e indivíduo indesejável.
(B) Ser definidor da espécie e pessoa irritada.
(C) Fóssil imprestável para pesquisa e sujeito atrevido.
(D) Forma de desaparecimento voluntário e pessoa aflita.
(E) Espécie hipotética intermediária e sujeito perturbado.


LITERATURA BRASILEIRA

QUESTÃO 11 - Leia o fragmento a seguir.

            O tambor e a dança são invenções do Jacaré, que os homens receberam de legado para compensar suas misérias. Dançando e percutindo o tambor os homens mantêm o Jacaré adormecido, impedindo que a terra trema e as águas primordiais sejam
cuspidas pela boca da Serpente-dragão, num outro dilúvio. Os monstros subterrâneos deixam escapar pequenos suspiros d'água, em forma de nascentes, que descem as chapadas, umedecendo as florestas. O Jacaré acordará um dia, destruindo o mundo dos homens.
            Contra o perigo se resguardavam os cariris, primeiros habitantes desta terra, zelo de que também se tomaram os brancos colonizadores, quando chegaram matando o que era vivo. Traziam os negros da África, com os mesmos olhos dos índios, de enxergar o sagrado em tudo.

BRITO, Ronaldo Correia de. Livro dos homens. São Paulo: Cosac Naify, 2005. p. 58.

No conto “A peleja de Sebastião Candeia”, de que se extraiu o fragmento acima, presentifica-se uma das temáticas recorrentes na obra Livro dos homens, a qual se expressa pela

(A) reelaboração de mitos da cultura africana.
(B) banalização da cultura indígena.
(C) valorização de tradições culturais.
(D) negação de crenças religiosas.
(E) rendição do sertanejo às misérias humanas.

QUESTÃO 12 - Leia o fragmento abaixo.

XIV
Sete de setembro
I
[...]
O santo amor dos corações ardentes
Achou eco no peito dos valentes
No campo e na cidade;
E nos salões — do pescador nos lares,
Livres soaram hinos populares
À voz da liberdade!
[...]
II
Anos correram; — no torrão fecundo
Ao sol de fogo deste novo-mundo
A semente brotou;
E franca e leda, a geração nascente
À copa altiva da árvore frondente
Segura se abrigou!
À roda da bandeira sacrossanta
Um povo esperançoso se levanta
Infante e a sorrir!
A nação do letargo se desperta,
E — livre — marcha pela estrada aberta
Às glórias do porvir!
[...]

ABREU, Casimiro de. As primaveras. São Paulo: Martin Claret, 2008. p. 58-59.

No Livro Primeiro de As primaveras, há poemas marcados por um ideário patriótico, deflagrado pela independência política do país. Os escritores românticos desse período tomaram para si a tarefa de erguer as bases da identidade nacional tematizando a pátria e o povo brasileiro, como revela o poema “Sete de setembro”, de Casimiro de Abreu. Em relação a esse ideário patriótico, a ideia que está presente nas três estrofes transcritas, conferindo-lhes unidade, é a de

(A) idealização do povo brasileiro.
(B) exaltação da luta pela liberdade.
(C) expectativa da grandeza futura do país.
(D) celebração do amor à bandeira pátria.
(E) valorização da natureza brasileira.

QUESTÃO 13 - Leia o fragmento que segue.

            Quando morava em Londres vi um filme interessante, do Wim Wenders e do Antonioni, se não me engano. A certa altura do filme, um personagem conta a história de uma expedição de arqueólogos ingleses ao México, à procura de registros da civilização asteca. Os ingleses contratam uma equipe de guias formada por nativos e iniciam a expedição. A certa altura, sem motivo algum, os nativos interrompem a caminhada. Os arqueólogos se espantam, ficam irritados, o tempo é precioso e eles estão pagando pelo trabalho dos guias. […] Os ingleses insistem, querem uma explicação, exigem, e só então o chefe dos nativos explica: haviam caminhado muito depressa e as almas tinham ficado para trás. Por isso permaneceram sentados, esperando, até que as almas se juntassem novamente aos corpos e eles pudessem seguir viagem.

CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p. 144-145.

A Geografia concebe as expedições como os primeiros instrumentos de construção do conhecimento geográfico, assim como ocorreu no Brasil com os primeiros viajantes que registraram suas impressões sobre os lugares explorados. No trecho citado, o narrador alude à expedição, que, na parte sublinhada, se configura como metáfora para a compreensão do enredo. No que diz respeito ao percurso do protagonista, tal metáfora refere-se

(A) à reflexão sobre a necessidade de viajar, que o leva a valorizar as experiências das andanças.
(B) ao cansaço após todas as peregrinações, que o conduz a buscar outro modo de viver.
(C) ao desgaste pelas aventuras vividas na Europa, que o faz mudar o destino das viagens.
(D) à consciência do conhecimento adquirido de modo aleatório, que o conduz à vontade de parar.
(E) ao acúmulo de informações sobre os países, que o faz perceber o quanto ainda faltava conhecer.

QUESTÃO 14 - Os livros O demônio familiar, de José de Alencar, e Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, representam costumes de um dado contexto social. Assim, o primeiro livro enquadra-se na comédia de costumes e o segundo, no romance de costumes. A filiação dessas obras a tais gêneros é reconhecida porque nelas se constatam, respectivamente,

(A) elaboração de cenas desvinculadas de sentidos moralizantes; presença de heróis com características do pícaro da novela espanhola.
(B) manutenção de uma condição social sustentada pela escravidão doméstica; foco nos contextos aristocráticos relacionados à classe social alta.
(C) construção do desfecho caracterizado por desentendimentos generalizados; fixação da malandragem por meio de situações cômicas.
(D) reprodução do modo de vida das mulheres definido pelos padrões patriarcais; enaltecimento de valores representativos das instituições religiosas.
(E) representação de personagens inspiradas na burguesia vigente; configuração de traços caricaturais de variados tipos populares.

QUESTÃO 15 - Leia os trechos dos poemas a seguir.

A VALSA SERESTA

Tu, ontem,
Na dança
Que cansa,
Voavas
Co'as faces
Em rosas
Formosas
De vivo,
Lascivo
Carmim;
Na valsa
Tão falsa,
Corrias,
Fugias,
Ardente,
Contente,
Tranquila,
Serena,
Sem pena
De mim!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas...
— Eu vi!...
[…]

ABREU, Casimiro de. As primaveras. São Paulo: Martin Claret, 2008. p. 83.

[...]
Parar à tua porta
e nem bater... A um canto
ficar como afinando
um violão invisível
que será contracanto
ao desencanto e ao canto
que em mim, como falhada
voz de um pássaro, dorme
dentro de mim, bem dentro.
[...]
SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia: Cegraf/UFG, 1991. p. 125.

Nestes trechos encontra-se uma característica essencial à identificação do gênero lírico, que é a

(A) alusão a desencontros amorosos.
(B) valorização de um tempo pretérito.
(C) apresentação de estados de alma.
(D) descrição metafórica da mulher.
(E) tematização de ritmos musicais.

QUESTÃO 16 - Leia os seguintes fragmentos.

            Ele ficou ainda um tempo naquela posição e quando levantou a cabeça e me olhou levei um susto: era exatamente igual a mim, tinha o meu rosto quando jovem, magro, branco, muito branco, uns vinte anos, senti um calafrio correndo por toda a espinha, era como se eu estivesse me olhando no espelho, num antigo espelho. Sou eu, falei comigo mesmo, aquele garoto sou eu. Ele ficou me olhando, a expressão neutra, olhávamos fixamente um para o outro mas o rosto dele não se alterava, nada, por um momento tive a impressão de que ele não me via, de que eu estava invisível, ele talvez estivesse vendo apenas alguma coisa no muro, um cartaz, uma coisa qualquer, não olhava para mim, olhava através de mim, foi o que pensei.

CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p. 193-194.

            Caiu de cócoras, sem tino de nada, e só então reparou na roupa desalinhada do marido, na barba de dias e nas migalhas de bolo presas aos fios do bigode. Tomada por uma ternura insuportável, abraçou-se a ele aos prantos, e o perdoou por deixar seus objetos pessoais, selas, arreios e esporas em profusão, para ela que há tempo não montava um cavalo, pois engordara muito. Nos anos de luto que estavam por vir, teria de justificar às visitas a parede que erguera, dividindo a casa em duas. Um vão inteiro servia apenas para esconder as lembranças do marido. Naquele santuário escuro e fedorento a mofo, ninguém entrava, a não ser os netos, guardiões assombrados da história de Francisco Vieira, Chiquinho, como só ela chamava.

BRITO, Ronaldo Correia de. Livro dos homens. São Paulo: Cosac Naify, 2005. p. 136.

Comparecem nestes fragmentos marcas da ficção contemporânea que, no contexto de cada uma das obras a que eles pertencem, são representadas, respectivamente, pela

(A) tematização da loucura; adesão ao ponto de vista do marginalizado.
(B) fragmentação do ser; superposição de diversos planos temporais.
(C) descaracterização do gênero confessional; ruptura das fronteiras espaciais.
(D) ênfase na linearidade do enredo; recorrência de desfechos em aberto.
(E) presença do narrador em primeira pessoa; utilização de recursos intertextuais.

QUESTÃO 17 - Por se afastar das orientações gerais que caracterizam o Romantismo brasileiro, o romance Memórias de um sargento de milícias ocupa uma posição singular entre as obras que pertencem a esse período literário. No contexto dessa obra, tal singularidade evidencia-se na

(A) estrutura do livro, composta de episódios alternados e capítulos curtos.
(B) linguagem do narrador, marcada pela coloquialidade e simplicidade expressiva.
(C) temática histórica, buscada no Brasil do reinado de Dom João VI.
(D) composição das personagens, desprovida de caracteres idealizantes.
(E) matéria do enredo, baseada em ações cotidianas de pessoas comuns.

QUESTÃO 18 - Leia os textos a seguir.

Máscaras

A vida nos põe no rosto
máscaras de gosto e desgosto
que o tempo afoga
em espelho sem nexo
e sem tamanho
onde fica o reflexo
do rosto de um estranho
que se interroga

SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia: Cegraf/UFG, 1991. p. 185.

            […] já não estou certo do fato de ser um homem ou alguma outra coisa não definida, quem sabe tenha me transformado num ser híbrido, entre homem e Deus, embora ninguém acredite em mim, nem mesmo a senhora, o que é realmente uma pena. [...] Então, se ninguém acredita em mim, sobretudo a senhora, posso me considerar Deus? Não? Mas homem também não sou, pelo menos não do tipo que se conhece. Então o que é que eu sou?, a senhora me faria o favor de responder a esta pergunta: o que é que eu sou?

CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p. 158.

A reflexão elaborada pelo eu lírico do poema “Máscaras” remete a um questionamento recorrente em Nova antologia poética, o qual está presente também no romance de Flávio Carneiro como um dos motivadores da confissão feita pelo protagonista. O sentido partilhado pela reflexão elaborada nos textos transcritos acima é instaurado pela

(A) compreensão do significado do tempo, elaborada no processo natural de crescimento do ser.
(B) perda das marcas de humanidade, ocasionada pelo confronto do ser com as dificuldades da vida.
(C) transformação de experiência em aprendizado, promovida pela crença nos desígnios de Deus.
(D) consciência da instabilidade da essência do ser, adquirida no percurso do destino humano.
(E) indagação acerca da identidade do ser, motivada pela vontade natural de autoconhecimento.

QUESTÃO 19 - Entre as características do Romantismo brasileiro, a que está corretamente inserida no contexto da comédia O demônio familiar e se filia ao projeto romântico de nacionalização da Literatura brasileira é a

(A) reivindicação de uma forma brasileira de expressão da língua portuguesa, compreendida na crítica à fala afrancesada de Azevedo.
(B) valorização da cultura nacional, explícita nos reiterados elogios e na calorosa defesa das personagens à arte e aos artistas brasileiros.
(C) representação heroica do homem brasileiro, fixada pelos traços idealizantes e pelas ações enobrecedoras da personagem Eduardo.
(D) tematização da sociedade brasileira, expressa na investigação minuciosa do drama da escravidão e na crítica à burguesia fluminense.
(E) exaltação da liberdade formal, evidenciada no modo simples e eficiente como a personagem Pedro distingue prosa e poesia.

QUESTÃO 20 - Leia os fragmentos do poema abaixo.

Romance de Itapoã
[…]
— Ó conchas, dizei-nos
que par era o par
entrando na igreja
para se casar?
— Foi um senhor nobre
daqui do lugar.
E a moça de encanto
assim singular,
a afogar-se em rendas
de um branco lunar,
não veio das nuvens
e nem de além-mar.
Eu vos digo: era ela
a bela Guiomar.
Não se vira nunca
um mais puro olhar
do que o dela quando
chegava ao altar.
E por muito tempo
não se ouviu contar
que houvesse entre os homens
outro similar
a mostrar no porte
força de um jaguar
e que assim tivesse
majestades no ar,
como era o marido
da bela Guiomar.
[...]
— Dizei-nos, ó conchas,
onde foi parar
depois o marido
da bela Guiomar.
— Ninguém nunca soube,
nem se ouviu contar.
Deixou a Bahia
sem que terra ou mar
mostrasse num rastro
o que pôde o azar
dentre os rumos tantos
um rumo lhe dar.
[…]
SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia: Cegraf/UFG, 1991. p. 84-86.

O poema “Romance de Itapoã”, do qual foram extraídos os fragmentos acima, forma com “Toada Goiana”, “O poço da roda”, “Toada do enjeitado”, “A noiva do sobrado” e “A moça de Goiatuba” uma série cuja unidade é conferida pela

(A) exploração de temas e espaços míticos.
(B) utilização de narrador, enredo e personagens.
(C) representação idealizada do tempo presente.
(D) personificação de seres da natureza.
(E) evocação de elementos da memória afetiva.



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