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terça-feira, 26 de julho de 2011

Texto - "Aula de Inglês" - Rubem Braga

Aula de Inglês

—  Is this an elephant?

Minha tendência imediata foi responder que não; mas a gente não deve se deixar levar pelo primeiro impulso. Um rápido olhar que lancei à professora bastou para ver que ela falava com seriedade, e tinha o ar de quem propõe um grave problema. Em vista disso, examinei com a maior atenção o objeto que ela me apresentava.
Não tinha nenhuma tromba visível, de onde uma pessoa leviana poderia concluir às pressas que não se tratava de um elefante. Mas se tirarmos a tromba a um elefante, nem por isso deixa ele de ser um elefante; mesmo que morra em consequência da brutal operação, continua a ser um elefante; continua, pois um elefante morto é, em princípio, tão elefante como qualquer outro. Refletindo nisso, lembrei-me de averiguar se aquilo tinha quatro patas, quatro grossas patas, como costumam ter os elefantes. Não tinha. Tampouco consegui descobrir o pequeno rabo que caracteriza o grande animal e que, às vezes, como já notei em um circo, ele costuma abanar com uma graça infantil.
Terminadas as minhas observações, voltei-me para a professora e disse convincentemente:
 —  No, it's not!
 Ela soltou um pequeno suspiro, satisfeita: a demora de minha resposta a havia deixado apreensiva. Imediatamente perguntou:
 —  Is it a book?
 Sorri da pergunta: tenho vivido uma parte de minha vida no meio de livros, conheço livros, lido com livros, sou capaz de distinguir um livro a primeira vista no meio de quaisquer outros objetos, sejam eles garrafas, tijolos ou cerejas maduras — sejam quais forem. Aquilo não era um livro, e mesmo supondo que houvesse livros encadernados em louça, aquilo não seria um deles: não parecia de modo algum um livro. Minha resposta demorou no máximo dois segundos:
 —  No, it's not!
 Tive o prazer de vê-la novamente satisfeita — mas só por alguns segundos. Aquela mulher era um desses espíritos insaciáveis que estão sempre a se propor questões, e se debruçam com uma curiosidade aflita sobre a natureza das coisas.
 —  Is it a handkerchief?
 Fiquei muito perturbado com essa pergunta. Para dizer a verdade, não sabia o que poderia ser um handkerchief; talvez fosse hipoteca... Não, hipoteca não. Por que haveria de ser hipoteca? Handkerchief! Era uma palavra sem a menor sombra de dúvida antipática; talvez fosse chefe de serviço ou relógio de pulso ou ainda, e muito provavelmente, enxaqueca. Fosse como fosse, respondi impávido:
—  No, it's not!
Minhas palavras soaram alto, com certa violência, pois me repugnava admitir que aquilo ou qualquer outra coisa nos meus arredores pudesse ser um handkerchief.
Ela então voltou a fazer uma pergunta. Desta vez, porém, a pergunta foi precedida de um certo olhar em que havia uma luz de malícia, uma espécie de insinuação, um longínquo toque de desafio. Sua voz era mais lenta que das outras vezes; não sou completamente ignorante em psicologia feminina, e antes dela abrir a boca eu já tinha a certeza de que se tratava de uma palavra decisiva.
 —  Is it an ash-tray?
 Uma grande alegria me inundou a alma. Em primeiro lugar porque eu sei o que é um ash-tray: um ash-tray é um cinzeiro. Em segundo lugar porque, fitando o objeto que ela me apresentava, notei uma extraordinária semelhança entre ele e um ash-tray.  Era um objeto de louça de forma oval, com cerca de 13 centímetros de comprimento.
As bordas eram da altura aproximada de um centímetro, e nelas havia reentrâncias curvas — duas ou três — na parte superior. Na depressão central, uma espécie de bacia delimitada por essas bordas, havia um pequeno pedaço de cigarro fumado (uma bagana) e, aqui e ali, cinzas esparsas, além de um palito de fósforos já riscado. Respondi:
 —  Yes!
 O que sucedeu então foi indescritível. A boa senhora teve o rosto completamente iluminado por onda de alegria; os olhos brilhavam — vitória! vitória! — e um largo sorriso desabrochou rapidamente nos lábios havia pouco franzidos pela meditação triste e inquieta.  Ergueu-se um pouco da cadeira e não se pôde impedir de estender o braço e me bater no ombro, ao mesmo tempo que exclamava, muito excitada:
 —  Very well!  Very well!
 Sou um homem de natural tímido, e ainda mais no lidar com mulheres. A efusão com que ela festejava minha vitória me perturbou; tive um susto, senti vergonha e muito orgulho.
Retirei-me imensamente satisfeito daquela primeira aula; andei na rua com passo firme e ao ver, na vitrine de uma loja, alguns belos cachimbos ingleses, tive mesmo a tentação de comprar um. Certamente teria entabulado uma longa conversação com o embaixador britânico, se o encontrasse naquele momento. Eu tiraria o cachimbo da boca e lhe diria:
   It's not an ash-tray!
 E ele na certa ficaria muito satisfeito por ver que eu sabia falar inglês, pois deve ser sempre agradável a um embaixador ver que sua língua natal começa a ser versada pelas pessoas de boa-fé do país junto a cujo governo é acreditado.

(Rubem Braga, crônica publicada no jornal “Folha da Manhã”, em maio de 1945)

Leia também:

"Gato Família" - Moacyr Scliar 
"Defenestração" - Luis Fernando Verissimo


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segunda-feira, 25 de julho de 2011

JOSÉ PAULO PAES - POEMAS

JOSÉ PAULO PAES - POEMAS

Convite

Poesia
é brincar com palavras
como se brinca
com bola, papagaio, pião.

Só que
bola, papagaio, pião
de tanto brincar
se gastam.

As palavras não:
quanto mais se brinca
com elas
mais novas ficam.

Como a água do rio
que é água sempre nova.

Como cada dia
que é sempre um novo dia.

Vamos brincar de poesia?

(José Paulo Paes)

Epigrama

Entre sonho e lucidez, as incertezas.
Entre delírio e dever, as tempestades.
Ai, para sempre serei teu prisioneiro
Neste patíbulo amargo de saudades... 

(José Paulo Paes)

"Onde um lúcido menino propõe uma nova infância. Ali repousa o  poeta."

Escolha de túmulo 


Onde os cavalos do sono
batem cascos matinais.

Onde o mundo se entreabre
em casa, pomar e galo.

Onde ao espelho duplicam-se
as anêmonas do pranto.

Onde um lúcido menino
propõe uma nova infância.

Ali repousa o poeta.

Ali um voo termina,
outro voo se inicia.

(José Paulo Paes, in "Prosas Seguidas de Odes Mínimas")

O Aluno

São meus todos os versos já cantados;
A flor, a rua, as músicas da infância,
O líquido momento e os azulados
Horizontes perdidos na distância.

Intacto me revejo nos mil lados
De um só poema. Nas lâminas da estância,
Circulam as memórias e a substância
De palavras, de gestos isolados.

São meus também, os líricos sapatos
De Rimbaud, e no fundo dos meus atos
Canta a doçura triste de Bandeira.

Drummond me empresta sempre o seu bigode,
Com Neruda, meu pobre verso explode
E as borboletas dançam na algibeira.

(José Paulo Paes)

Um retrato

Eu mal o conheci
quando era vivo.
Mas o que sabe
um homem de outro homem?

Houve sempre entre nós certa distância,
um pouco maior que a desta mesa onde escrevo
até esse retrato na parede
de onde ele me olha o tempo todo. Para quê?

[...]

Até o dia em que tive de ajudar
a descer-lhe o caixão à sepultura.
Aí então eu o soube mais que ausência.

Senti com minhas próprias mãos o peso
do seu corpo, que era o peso
imenso do mundo.

Então o conheci. E conheci-me.
Ergo os olhos para ele na parede.
Sei agora, pai,
o que é estar vivo.

(José Paulo Paes)


www.veredasdalingua.blogspot.com.br

Leia também:

Castro Alves - O Poeta dos escravos
"Gato Família" - Moacyr Scliar
"Manuelzão e Miguilim" - Guimarães Rosa
Aula de Inglês - Rubem Braga


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sexta-feira, 22 de julho de 2011

SUBSTANTIVO – FLEXÃO DE GRAU

SUBSTANTIVO – FLEXÃO DE GRAU

O substantivo apresenta as seguintes flexões de grau:

Grau
Exemplos
Normal
Casa, chinelo
Aumentativo
Casarão, chinelão
Diminutivo
Casinha, chinelinho

Na tirinha abaixo, os substantivos rei, imperador e czar estão em seu grau normal.

São dois os modos para a expressão de grau:

Analítico – O substantivo permanece em sua forma original e são acrescentados adjetivos que denotam o grau aumentativo ou diminutivo.

Exemplo: bicicleta grande, bicicleta pequena; sofá grande, sofá pequeno.

Sintético – Acrescentam-se sufixos ao substantivo em sua forma normal.

Exemplos: peixe – peixão – peixinho; boca – bocarra – boquinha.

Na tirinha abaixo,a palavra passarinho está sendo usada em seu grau diminutivo sintético.


Observe agora os vários exemplos do grau aumentativo sintético na tirinha abaixo:



Lista dos principais sufixos aumentativos e diminutivos

Sufixos aumentativos
Sufixos diminutivos
aça – barca – barcaça
acho – rio – riacho
aço – bala – balaço
ebre – casa – casebre
alha – muro – muralha
eca – sono – soneca
anzil – corpo – corpanzil
eco – jornal – jornaleco
ão – carro – carrão
ejo – vila – vilarejo
arão –casa – casarão
eta – sala – saleta
ito – rapaz – rapazito
aréu – fogo – fogaréu
eto – folha – folheto
arra – boca – bocarra
inho – sapato – sapatinho

isco – chuva – chuvisco
ona – menina – meninona
ola – bandeira – bandeirola
orra – cabeça – cabeçorra
ote – caixa – caixote
zio – copo – copázio
ota – aldeia – aldeota
zão – pé – pezão
zinho – irmão – irmãozinho
zarrão – cão – canzarrão
zito – pé – pezito

Observações:
 
1. O substantivo pode mudar de gênero ao mudar de grau.

Ex.: o muro – a muralha / a bala – o balaço / a casa – o casarão, etc.

2. O diminutivo pode indicar afetividade, carinho.

Ex.: mãezinha, paizinho, amorzinho, etc.

3. O diminutivo pode ainda ser usado de uma forma depreciativa.

Ex.: velhote, mulherzinha, livreco, etc.

por Prof. Maurício Fernandes da Cunha - www.veredasdalingua.blogspot.com.br

Exercícios

1. Indique o grau diminutivo sintético dos substantivos abaixo:

Cão =
Urso =
Fio =
Escola =
Gato =
Folha =
Homem =
Menino =
Avô =
Carro =
Caderno =  
Chácara =
Café =
Corpo =
Chuva =
Filho =
Carta =
Peixe =
Gole =
Cabra =

2. Indique o grau aumentativo sintético dos substantivos abaixo:

Corpo =
Copo =
Boca =
Dedo =
Forno =
Garrafa =
Sapo=
Mesa =
Chinelo =
Problema =
Pedra =
Aumento=
Livro =
Carro =
Colher =
Chapéu=
Fogo =
Rio =
Nariz =
Dente =

Prof. Maurício Fernandes da Cunha

Leia também:
Substantivo - Flexão de Número
Substantivo Coletivo



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